o amor também se desfaz em silêncio
nem todo fim chega com barulho. nem toda ruptura acontece em meio a gritos,
portas batidas ou discussões sem fim. tem amor que não explode — evapora. vai
saindo de cena devagar, pelos cantos, nas pequenas ausências, nas conversas que
diminuem, nas mensagens que demoram, nos olhares que evitam o encontro.
ninguém fala em término, mas tudo termina.
é difícil perceber esse tipo de fim, porque ele não vem com data, não vem
com anúncio, não vem com drama. vem com silêncio. com a falta de vontade de
dividir o dia. com a preguiça de perguntar como o outro está. com a sensação de
estar sozinho mesmo de mãos dadas. você continua junto, mas já não tá mais ali. e
o outro também não.
o mais cruel desse tipo de separação é que não dá pra apontar o momento
exato em que tudo começou a sumir. não dá pra dizer “foi ali”. porque não foi. foi
aos poucos. foi naquele dia em que você se esforçou pra conversar e a resposta
veio fria. foi quando você contou uma dor e a pessoa não ouviu direito. foi quando
você precisou de apoio e ela escolheu dormir cedo. foi quando você começou a
sentir que estava falando com alguém que não te reconhecia mais.
e ainda assim você ficou. porque ninguém brigou. ninguém foi embora.
ninguém confessou nada. não teve traição, não teve escândalo. só teve cansaço.
rotina. desconexão. distância. tudo aquilo que a gente subestima até virar abismo.
o amor, quando se desfaz em silêncio, é mais difícil de encerrar. porque não
tem uma causa clara, não tem um culpado evidente, não tem o alívio do confronto.
tem só um acúmulo de pequenos vazios que vão comendo tudo por dentro. e,
quando você percebe, não sente mais dor. sente nada. que, às vezes, é pior.
e aí vem a dúvida. será que ainda dá pra recuperar? será que ainda tem
jeito? ou será que só restou o hábito, o medo de recomeçar, o apego ao que um dia
foi? o silêncio, nesse ponto, já virou resposta. e por mais que doa admitir, amor que
precisa ser forçado pra existir já não é amor — é insistência.
é preciso coragem pra enxergar isso. pra aceitar que acabou mesmo sem
ninguém ter dito. pra entender que a ausência de conflito não significa presença de
afeto. tem gente que fica por inércia, por conveniência, por medo. mas isso não é
amor. amor de verdade é encontro, não manutenção.
se você tá aí tentando ressuscitar o que já não pulsa, talvez precise lembrar
que amor, quando é real, não exige tanto esforço pra continuar existindo. ele pode
dar trabalho, sim, mas não precisa ser reconstruído todo dia do zero.
e quando chega nesse ponto, talvez a pergunta não seja mais “como
salvar?”, mas “por que ainda estou tentando?”.
e aí, sem ninguém gritar, sem ninguém bater porta, o fim acontece. porque o
amor, às vezes, não vai embora. ele só para de voltar.
@enricopierroofc

Enquanto você se abandona o mundo continua

Você continua tentando dar conta de tudo. Responde sorrindo, organiza a
rotina, resolve o que precisa ser resolvido, escuta o problema dos outros,
entrega o que te pedem. Por fora, parece estável. Por dentro, você não lembra
mais o que sente. Não porque não sente nada, mas porque não sobra espaço
para sentir. Está tudo ocupado. Cheio de função, cheio de pressão, cheio de
expectativa. E você foi ficando pequeno no meio disso tudo. Foi esquecendo de
si.
O problema é que ninguém percebe. E nem vai perceber. Porque você
se tornou funcional. Você aprendeu a esconder. A engolir o cansaço, a adiar o
choro, a deixar para depois o que você mesmo precisa. E o mundo, que adora
eficiência, aplaude. Quanto mais você se anula, mais dizem que você é forte,
que você é maduro, que você dá conta. Mas a verdade é que dar conta não
significa estar bem. Dar conta não significa estar inteiro. Dar conta, às vezes, é
só o que resta quando a gente já desistiu de ser cuidado.
E enquanto você se abandona, o mundo não para. Ninguém vai frear por
sua causa. Ninguém vai notar o seu limite se nem você respeita ele. O chefe
vai continuar pedindo mais. A família vai continuar esperando. As pessoas ao
redor vão seguir contando com você. Porque foi assim que você ensinou o
mundo a te ver: como alguém que está sempre disponível, mesmo quando não
aguenta mais. E se você não mudar isso, ninguém vai mudar por você.
É duro aceitar, mas é simples: ninguém vai te salvar. Se você continuar
se colocando por último, ninguém vai te puxar de volta. É você quem precisa
interromper esse ciclo. E não precisa ser com grandes decisões. Às vezes, é
só dormir mais cedo. É só parar de responder todo mundo. É só dizer “não
quero”, “não posso”, “não agora”. É só se ouvir. Porque, se continuar nesse
ritmo, você não vai durar. E aí, quando desabar, vai perceber que passou a
vida sendo tudo para todo mundo e nada para si.
Você não foi feito para sustentar o mundo. E também não precisa pedir
desculpa por querer se cuidar. É agora que você precisa se escolher. Porque
se você não voltar para si, ninguém volta por você.
@enricopierroofc

Nada é tão urgente quanto parece no meio do caos

Quando tudo parece desabar ao mesmo tempo, nosso impulso é correr.
Reagir. Resolver. Como se agir rápido fosse a única forma de não afundar. Só
que, em momentos assim, o que a gente mais precisa raramente é velocidade.
O que a gente precisa, mesmo, é clareza.
E clareza não se encontra no meio do turbilhão. Não aparece enquanto
o coração dispara, enquanto o corpo está em alerta, enquanto a cabeça gira
sem parar. Decisões tomadas em estado de urgência geralmente carregam o
peso da pressa, não da consciência. E o que a gente chama de “resolver logo”
pode acabar virando um novo problema.
O mundo nos ensinou a confundir rapidez com eficiência. Associar
movimento com solução. Mas há dores que não se curam correndo, há
respostas que não nascem no grito, há escolhas que precisam de silêncio
antes de serem feitas. Existe uma sabedoria enorme em saber esperar. Não
por passividade, mas por inteligência emocional. Por presença. Por
autocuidado.
Quem aprendeu a parar no meio da tempestade não se perdeu no
caminho. Quem soube respirar antes de reagir, evitou ferir mais do que já
estava machucado. Quem se permitiu recuar por um instante, voltou mais
inteiro.
Nem tudo precisa ser feito agora. Nem toda mensagem precisa de
resposta imediata. Nem todo conflito exige confronto. Às vezes, a pausa salva
o que a pressa destruiria. E às vezes, o que parecia urgente se mostra
irrelevante com o tempo. Porque o tempo, quando respeitado, revela
proporções verdadeiras.
O caos é barulhento, mas a sabedoria costuma sussurrar. Por isso,
quem aprende a escutar de dentro para fora já não se desespera com tanta
facilidade. Não porque a vida ficou leve, mas porque o olhar ficou mais sereno.
No fundo, você não precisa de mais pressa. Precisa de mais presença.

@enricopierroofc